- Johanna Homann
- 18 de out. de 2024
- 2 min de leitura
Enquanto arrumava a casa, lembrava do dia em que ela me contou que já tinha escondido a sujeira debaixo do tapete para esperar a visita de última hora. Eu sempre duvidei se era folclore. Agora, ela seria a visita, porém, uma visita planejada, que eu esperei por muito tempo. Eu continuava no mesmo bairro, na mesma cidade, quase na mesma rua. Ela tinha batido asas, literalmente, para a cidade do Plano Piloto. Nossos voos ficaram distantes, mas essa amizade tão única, carregada de memórias, se bastava no amor. A cada reencontro, ainda que esporádico, as mesmas risadas, a mesma emoção, e a conversa continuava de onde parou.
Varri cada canto, perfumei a casa, comprei vaso de flor, forro de mesa, aquelas coisas miúdas de mineiro, para receber a minha Elaine. Aquela de tantos folclores, do carnaval de Diamantina, das cantorias, do "Negro Gato" no violão, das trocas no trabalho, das palhaçadas na pista do Cassino Dancing Show e do colo na madrugada, no momento do sufoco. Expectativa de quem tem muito a contar e mais ainda a ouvir, afinal, em dez anos, muito se vive. Ela chegou com um presente delicado e uma garrafa de vinho.
Um abraço apertado jogou para longe a saudade da presença cotidiana que já experimentamos por tantos anos. Procurei o abridor de garrafa elétrico que jurava ter em casa, mas certamente havia sido esquecido na casa de alguém. Eu já não me lembrava quando tinha sido a última reunião na casa de amigos.
Só encontrei o saca-rolhas manual no fundo da gaveta. O tema da conversa era justamente a força feminina, nossas lutas e conquistas, e, logo ali, naquele momento, a gente não podia esmorecer. A ponta afiada da espiral perfurou a rolha, mas entrou torta. Frustração! Passei a garrafa para a Elaine, que também não conseguiu acertar o rumo. Não é possível! Duas mulheres tão maduras e decididas não conseguem abrir uma garrafa de vinho? "Isso não é força, é jeito!"
Pedimos socorro ao porteiro, que, definitivamente, não ajudou em nada. A vontade do vinho só aumentava. Virou uma questão de honra. Frustradas com a nossa incompetência, pedimos ajuda à vizinha, que nos deu a dica da pressão. Bastou uma batidinha de leve no fundo da garrafa com um pano na parede e a rolha saiu com certa facilidade. Era simples! Era como a vida da gente! Um tanto de história envasada pelo tempo, relembrada ali, num brinde e com gosto de quero mais. Tem coisas que a gente não sabe, mas aprende, né, Elaine?
Simples assim!